O Matungo A Santa E O Domador
Composição: Dari Sortica.O matungo, a santa e o domador
Num canto da estrebaria
O tubuna se coçava
Meio de esgueio mirava
O peão, em zombaria
Que matungo porcaria
Pegara para enfrenar
Tão esnobe no olhar
Parecia assombração
Que apeia no rincão
Com ganas de incomodar
Tinha ficado aporreado
Cheio de manha o alimal
Aceitava o buçal
Mas ficava desalmado
Quando um cuera preparado
Se lhe sentava no lombo
E depois de um triste tombo
Se mandava a la cria
Indo buscar companhia
Do demônio, sem assombro
Numa manhã ensolarada
Em dezembro, dia oito
Para a doma estava afoito
Que dia santo que nada
A festa da Imaculada
Muito pouco lhe dizia
Tinha respeito à Maria
Mas não era, assim, devoto
Pouco sabia, de fato
Da religião que seguia
E assim, entusiasmado
Vai ao rancho de João
Na cincha leva o alazão
Que vai troteando de lado
Troca as orelhas, cismado
E ele chuleando o bicho
Mas para ti, não me micho
Pois meu filho, que é ginete
Vai te tirar o cacoete
De enjeitar o rabicho
O João era seu filho
Seu companheiro na lida
De coragem atrevida
Tinha luz e tinha brilho
E com ele o tordilho
Frouxaria o espinhaço
Nem que fosse a guascaço
Ou no golpe da chilena
O João era torena
E aguentava tironaço
No entanto sua nora
A esposa de João
Por honrar a religião
Quase em soluço implora
Meu marido, não é hora
De sair para domar
Venha comigo rezar,
Nesse dia abençoado
Penso até que é pecado
Em dia santo lidar
Embora a nora falasse,
O redomão encilhou
E nele o filho montou,
E como se não montasse
O cavalo num disfarce
Enganou o domador
Que dispensou o fiador,
Pois o que tinha de manso
O matungo, lhe afianço,
Tinha também de ator
Bueno, já está domado!
Larga o cabresto, meu pai!
Mas o bicho se contrai
E por ser flor de aporreado
Põe-se em pé, embodocado
E, em fração de segundo,
Vai do mundo ao submundo
Se boleia pra trás
Cai em cima do rapaz
Que ali fica moribundo
Foi levado ao hospital
Já quase entregando a alma
E o diabo batia palma
Já festejando o final
Pois ele estava bem mal,
Não acordou por três dias
E a família em romaria,
Em pedido de oração
Rezava, salva o João,
Ajuda, Virgem Maria!
E a Virgem intercerdeu
E João voltou à vida
Mas aquela dor doída
Muito choro lhe rendeu
Pois pusera um filho seu
Em contato com a morte
Mas foi num lance de sorte
E também de muito amor
Que a própria mãe do Senhor
O agarrou com braço forte
E lá estava o rufião
Se coçando, disfarçado
Mas será ele culpado,
Mau caráter, embrulhão?
Sente ele a aflição
De um pai em sofrimento?
Terá ele entendimento
Que a sua vida campeira
Acabou com a besteira
Que cometeu no momento?
As respostas, não as tenho
Tampouco fiquei sabendo
Se teve destino horrendo
O cavalo, me abstenho...
Poucas lembranças retenho
Daquela doma maldita
Quem viveu, não acredita
Que o domador se salvasse
E que à vida retornasse
Através da Mãe Bendita!