José
Composição: Emílio Dragão.José acordou bem cedo, outro dia de trabalho,
arrumou sua mochila rasgada pra pegar o balaio.
O toró ainda caia, seu guarda-chuva furado,
e José aqui é só mais um cidadão ferrado.
O sol não saia, uma nuvem negra e espessa.
Na construção José não entendia:
não tem mais tinta em sua caneta.
Ele disse quando chegasse o dilúvio,
ofereceria ao barqueiro usando capuz
duas pedras moldadas com a forma de sua cabeça:
"aceite meu bom barqueiro, pois eu não tenho moedas,
construí todos esses prédios e ainda moro na favela.
A minha grande sina é tentar sobreviver,
pois pra mim e pra muita gente,
o que resta é morrer".
Ao som de uma tela pintada à noite,
com o cheiro da corrente que arrasta.
E da minha janela vejo o mundo imundo,
que deixa mudo e paralisa.
E deixa o quase pobre pobre e o pobre podre,
E deixa o nobre cada vez mais podre de rico.
E deixa o rico cada vez mais podre e mais nobre,
E o pobre podre e quase pobre pobre, podre.
"Ele me promete um Brasil sem miséria, sem fome,
sem desilusão. Ele promete a dentadura, promete
a mesa sem faltar o pão. Ele promete o que a gente
quiser que ele prometa, acima do bem e acima do
mal. Promete acabar até com o capeta se chegar
no planalto central."