Peça Por Peça(Rei, Cavalo, Peão)
Composição: QI.Rei: No “xeque mate” o rei vai pra dentro do porta-malas, cativeiro, vítima de sequestro relâmpago, recebe coronhadas e é mutilado para envio de partes do corpo via correio como tentativa de êxito no pagamento do resgate e não somente encurralado como no xadrez comum. E caso a estratégia da organização criminosa não siga a risca o planejamento, o rei cai, baleado na cabeça, com a mesma arma vendida a preço de banana pela PM, ou comprada com o dinheiro que seu próprio filho gastou na aquisição de cocaína e êxtase na have de terça-feira ou no happy hour após a saída da faculdade. Esse tratamento é recíproco, levando em consideração o lucro exorbitante em cima da mão de obra escravizada, transições bilionárias com dinheiro público, financiamento de guerras, criminosa concentração de renda e outras atitudes. Infelizmente, nem todo rei tem um “xeque mate” que corresponde a suas atitudes no tabuleiro.
Cavalo: A polícia, desde a civil ou rodoviária que autorizam a passagem do carregamento de drogas e armas, até a PM que os distribui, fortalecendo e intensificando assim as guerras na quebrada, porém nunca vendem um quantitativo de armas além do limite pré-estabelecido, pois a favela nunca poderá ter mais armamentos que o corpo militar do estado para que o controle seja mantido, ou seja, a periferia só terá armas suficientes para o derramamento de sangue entre seus semelhantes. Essa peça também representa a cavalaria que pisoteia negros que lutam por cotas raciais nas universidades e as mães em portas de presídios rebelados. Na ronda noturna fica de campana, esperando passar o alvo, que depois de alvejado nas costas, servirá como álibi para a prática de extermínio, pois esse carregava as mesmas características do retrato falado que apareceu no computador da viatura. Essa mesma presa, quando do sexo feminino, sofrerá estupro coletivo, o mesmo serve para crianças, travestis e prostitutas. Estes são, não sozinhos, os responsáveis diretos pelos assassinatos, porém imunes graças aos altos de resistência, ocultação de cadáveres e encarceramento em massa. Mesmo tendo os salários pagos com impostos do contribuinte, a classe trabalhadora, servem e protegem somente os reis e seus interesses.
O Peão: Eu, você, qualquer pessoa que mora nas favelas, nas periferias, nos guetos, nas quebradas, nos barracos de alvenaria, nos barraco de madeira, nos morros, nas vielas, nos becos, nas ruas, nas calçadas, nas cracolândias, nas beiras dos córregos, nos esgotos, nas construções não finalizadas ou nas bocas de lobo. Os parceiros e as parceiras que estão no sistema penitenciário, nas unidades de internações. Os adolescentes que cumprem medida sócio educativa, os viciados, mendigos, artistas de semáforo, órfãos, os que nesse momento estão segurando um 38, uma pistola, um fuzil ou uma faca pra defender seus ideais, os trabalhadores, as trabalhadoras, os desempregados, usuários de drogas, doentes, bêbados, baleados, as mulheres prostituídas, crianças escravizadas e os idosos, aqueles que catam papelões com carrinhos de supermercados ou aqueles que não tiveram a pratica do amor retribuída pelos seus filhos, as pessoas comuns. Todos esses sempre foram a linha de frente do confronto, os primeiros a morrerem, a contraírem doenças servindo de cobaia pra elite, os que aos olhos do inimigo não tem nenhum valor, o rico só nós enxerga como bonecos controláveis para gerar lucros em suas contas bancárias, tá na hora de mudar o jogo, tá na hora dos peões se conscientizarem de qual é a sua real posição no tabuleiro, tá na hora das peças pretas começarem o jogo, pois o cenário de guerra é só um, reis contra peões, o peão é a única peça que pode mudar no decorrer do jogo, ganhar poder, e mudar não significa servir a outra classe.
E aqui, são só dois peões pretos da periferia, Henrique e Kalango. Dois favelados que tem total clareza de quem é o inimigo, dois favelados que lutarão até a última gota de sangue para que as periferias tenham dias melhores, que não irão pedir, mas exigir a tomada de assalto de tudo que é de direito das pessoas que moram aqui, que não irão se iludir com suas demolições de presídios, falsas caridades em datas específicas e nem com seus discursos vazios, por mais progressistas que eles possam parecer, pois sabemos que são os donos dos chicotes e das algemas nos prendem e nos matam todos os dias, sabemos quem são os responsáveis pelo sangue derramado no tabuleiro.